Sete meses após um embargo econômico por terra, mar e ar decretado contra o Catar pela Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Egito, que provocou um temor generalizado em vários países sobre o futuro do comércio com esse rico país do Oriente, a situação é de alívio para as cerca de 250 empresas brasileiras que exportam para o Catar.
A justificativa para o embargo foi a de que o Catar estaria apoiando o terrorismo. A medida, contudo, não afetou as relações comerciais entre o Brasil e o Catar. Um balanço recente das trocas entre os dois países mostra que, embora ainda haja um saldo anual de US$ 25 milhões a favor do emirado árabe, os números mostram uma tendência de crescimento de vendas favorável ao Brasil no futuro próximo.
Esse crescimento é impulsionado por um aumento crescente das vendas para o Catar, ao mesmo tempo em que há uma redução gradativa das importações daquele país do Oriente Médio, fatores que podem gerar um superávit comercial para o Brasil já nos próximos meses.
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“Importamos do Brasil importantes commodities, como carne, frango e vegetais e exportamos combustíveis e fertilizantes”, disse o embaixador do Catar no Brasil, Mohammed Al-Hayki, que se mostra otimista sobre o crescimento do comércio entre os dois países.
De janeiro a dezembro de 2017, o Brasil exportou US$ 420,28 milhões para o Catar, representando um aumento nas vendas de 11,18% em relação ao ano anterior. Por outro lado, o Brasil importou, em 2017, US$ 445,86 milhões do emirado árabe, uma expansão de compras de apenas 3%.
Gás para Sergipe
O embaixador Al-Hayki considera, porém, que a importância dos atuais números é relativa. O relevante, segundo ele, é a tendência do intercâmbio comercial e as oportunidades que surgem para os dois países, envolvendo por exemplo o setor de gás natural, um produto que exige a aplicação de tecnologias de alta precisão e empregos de alta qualificação. Segundo ele, a partir de 2020 o Catar passará a ser um fornecedor regular de gás natural para o Brasil.
O produto complementará as fragilidades da matriz energética brasileira, hoje muito dependente das hidrelétricas e com muitos projetos ameaçados de interrupção devido à falta de chuvas nos últimos anos, que provoca a queda dos níveis dos reservatórios e, consequentemente, ameaçam paralisar o fornecimento de energia elétrica.
Por conta disto, a empresa Centrais Elétricas de Sergipe (Celse), responsável pela implantação Complexo Termoelétrico Porto de Sergipe I, assinou há um ano e dois meses um acordo com a Ocean LNG Limited, uma joint-venture entre a Qatar Petroleum e ExxonMobil, para receber gás natural do Catar.
O produto será usado para o complexo termoelétrico, que transformará o gás natural em energia elétrica, usando uma linha de transmissão de 33 quilômetros e um conjunto de instalações offshore, ou seja, afastadas da costa. Destas últimas, fazem parte uma unidade flutuante de armazenamento e regaseificação de gás natural (FSRU, na sigla em inglês) e um gasoduto. O gás, que chegará do Catar na forma líquida, será regaseificado nestas instalações.
Toda essa estrutura utilizará tecnologia de ponta, o que otimizará a usina em seu nível mais elevado de produção. O navio FSRU, que ficará ancorado e receberá o gás do Catar, terá capacidade para processar 170 mil metros cúbicos de gás natural, o suficiente para atender a unidade termoelétrica do complexo por 17 dias em plena carga, ou seja, funcionando 24 horas por dia.
Comércio bilateral e mundial
Para incentivar o comércio bilateral, o embaixador Al-Hayki considera que os dois países devem organizar visitas comerciais mútuas e exibir seus produtos. O Catar enviou uma missão ao Brasil no final de setembro passado, composta por 14 dirigentes de empresas e representantes do governo do Catar, entre eles o diretor executivo da agência de desenvolvimento de exportações do Catar, Hassan Khalifa Al Mansoori, que atua como importante agente financiador do comércio. A missão visitou órgãos do governo e entidades empresariais.
Mohammed Al-Hayki disse que o Brasil já passou por crises econômicas e políticas, mas continua sendo a oitava economia do mundo e tem todas as condições de se posicionar solidamente como um dos grandes atores do comércio mundial. Para alcançar esse nível de desenvolvimento, o embaixador do Catar sugere que o Brasil diminua os entraves burocráticos para a exportação de produtos, crie uma estrutura de transporte do interior até os portos e construa armazéns e silos adequados nos corredores de exportação.
Impacto do embargo
Embora seja uma das nações mais ricas do Oriente Médio, o Catar tem uma população de apenas 2,7 milhões de pessoas — a maioria dos quais imigrantes. Por se tratar de uma nação pequena, o impacto do seu embargo não causaria grandes preocupações na Europa, Estados Unidos e na Ásia não fosse o fato de que o país é hoje um fornecedor relevante de recursos naturais para todo o mundo. A Ásia e a Europa, por exemplo, são grandes compradores de gás natural do Catar.
Para suspender o embargo, uma das exigências foi a de que o Catar teria de fechar a emissora Al Jazeera, que é vista pela Arábia Saudita e outros países da região como simpática ao terrorismo. Al-Hayki contesta veementemente a informação de que o seu país apoia o terrorismo e lembra que, no atentado às Torres Gêmeas, em Nova York, ocorrido em 11 de setembro de 2001, a maioria dos terroristas envolvidos não era do Catar e sim da Arábia Saudita.
Outro ponto destacado pelo embaixador é a política exterior independente do Catar e a importância que o país dá à democracia. Segundo ele, o Catar não aceita as pressões dos países que impuseram o embargo para reduzir a liberdade de imprensa e fechar a Al Jazeera, a maior organização de mídia do mundo árabe. Ele disse que a emissora é uma organização que tem a liberdade de expressão como um de seus pilares. Essa liberdade, conforme disse o embaixador, é modelo para todo o Oriente Médio e decorre da sua independência garantida pelo Catar. “Essa nossa independência não está sujeita a negociações”, finalizou o embaixador.
Fonte: José Romildo – da Agência Brasil